Lizia ligou tudo
Texto em homenagem a minha orientadora escrito ao final da matéria de Crescimento Econômico Avançado, na graduação.
Em 11 de junho de 2023, esse ano, fiz um tweet que dizia: “Lizia ligou tudo”. À época, eu terminava o curso de macroeconomia 3, ministrado por Lizia de Figueirêdo (desde sempre); e, concomitantemente, começavam as minhas visitas ao seu gabinete, puxadas por um interesse quase natural que todo aluno ortodoxo-neoclássico-ou-qualquer-denominação-que-seja tem por professores que falam de Solow e instituições em um departamento de pensamento pluralmente heterodoxo. Fui em busca de conhecimento, ganhei muito mais: um novo horizonte de estudos, uma orientadora curiosa e uma amiga fraterna.
O processo começa com uma pergunta simples, que vem sendo feita há pelos menos 247 anos, quando a profissão foi fundada: qual é a natureza e a causa da riqueza das nações? A disputa para responder tal pergunta revolvia em torno de modelos, matemáticos ou não, que explicavam quase sempre parcial ou equivocadamente o fenômeno do crescimento econômico. Foi aí que entrou Solow, e todos os seus descendentes. E é isso que aprendemos em “macro 3”. Entendemos que, no capitalismo moderno, os níveis de produção são definidos pela poupança e pelo acúmulo de capital humano, e as taxas de crescimento são determinadas pelo aumento da produtividade total dos fatores.
Isso tudo que foi dito aí, contudo, são só os “determinantes próximos”, Lizia não se contenta com tão pouco, e tampouco a ciência econômica contemporânea, que vai além: quais são os determinantes últimos? Se capital físico, educação e produtividade determinam a renda per capita, o que determina capital físico, educação e produtividade, afinal? Ao longo de um semestre, e mais de 50 anos de pesquisas, várias hipóteses são levantadas – Geografia? Instituições? Cultura? Algumas prosperam e se relacionam, como instituições e cultura; outras se tornam mais esquecidas, como geografia.
O ápice da literatura do crescimento se deu em décadas recentes, com a revolução neoinstitucionalista, que mostrava, através de centenas de estudos empíricos, o papel de instituições no crescimento econômico. Quando se fala de instituições, contudo, é impossível não voltar a indagar “porquês”, e retoma-se a discussão sobre os aspectos culturais e sociológicos do desenvolvimento: em quais sociedades surgem instituições propícias para a boa performance econômica? Quais são as características das pessoas dessas comunidades? Há algo na água que bebem que os fazem tão ricos e institucionais? Quando se começa a pensar sobre isso, não se pensa em outra coisa, como dizia (outro) Lucas.
Foi assim que Lizia ligou tudo. Esse texto é cheio de perguntas, para as quais Lizia apresentou as melhores respostas possíveis disponíveis na literatura, com o maior rigor, com as ideias mais criativas. A costura dessa malha une tudo: psicologia evolucionista, teoria dos fundamentos morais, capital social, teoria econômica neoclássica, estacionamentos indevidos e rosas vendidas no sinal.
O curso de crescimento econômico avançado marcou, para mim, o início da compreensão da economia em toda a sua potencialidade, interdisciplinar, moderna, e capaz de responder até mesmo perguntas do âmago da natureza humana, mesmo que de forma limitada. E é isso que economistas deviam ser – aqueles que respondem da melhor forma que podem, com o ferramental que têm, perguntas sobre tudo que envolve esses negócios ordinários da vida.